Entrevistas

“Se nossa indústria não é competitiva, vamos importar fertilizantes”, diz Júlio Diehl, Gerente de Marketing e Qualidade da Fertigran.

Em entrevista ao GlobalFert, Júlio César de Barros Diehl, Gerente de Marketing e Qualidade da Fertigran, falou sobre o setor de fertilizantes líquidos, a produção nacional de fertilizantes e os principais desafios para 2018.

Júlio César de Barros Diehl, 74 anos, Engenheiro Agrônomo formado em 1967 pela ESALQ, sempre atuou no setor de fertilizantes e já trabalhou na Ultrafértil, Fosfertil, CRA, Copas, Fertibrás e está na Fertigran desde 1984.

1. O Grupo Fertipar possui alguns fertilizantes com tecnologia exclusiva, como por exemplo, o Super N. Na sua visão quais são os benefícios e vantagens do Super N em relação à Ureia convencional e Nitrato de Amônio?

 Para falar de Ureia ou Super N, temos que iniciar com conhecimentos gerais sobre Nitrogênio. Esse nutriente é o mais exigido pelos vegetais. Altas produtividades só são alcançadas quando a disponibilidade de N é elevada.

 O manejo correto de N é muito difícil, dado ao extremo dinamismo do mesmo no solo, as formas químicas de N se alteram a todo o momento em função de: microrganismos, umidade, temperatura, tipo de solo (com mais ou menos argila) luminosidade, cobertura vegetal, sistema radicular, fonte fornecedora, dose utilizada, época de utilização, localização no solo, teor de matéria orgânica, CTC, etc.

Essas diferentes formas químicas tem vários destinos, podendo ser: absorvidas pelas plantas, imobilizadas por microrganismos, retidas nas cargas positivas do solo, volatilizadas e lixiviadas. Esse dinamismo confere ao N um grande potencial de danos ao meio ambiente principalmente quando lixiviado ou volatilizado.

Uma das maiores preocupações dos pesquisadores de plantas e ambientalistas é a busca continua de formas de manejo dos fertilizantes nitrogenados de modo a aumentar sua eficiência, visando diminuir custos de adubação e minimizar os riscos ambientais. Nem todos sabem que não se usa análise de solo de N para recomendação de fertilizantes, pois dado ao seu dinamismo, as formas químicas analisadas mudam constantemente, não fornecendo parâmetros estáveis para balizamento das sugestões de adubação. Em função de todas essas variáveis os fertilizantes nitrogenados são os mais estudados na busca de inovações para melhorar o seu desempenho.

Atualmente existem duas linhas de produtos já oferecidos no mercado, os fertilizantes estabilizados e os de liberação lenta ou controlada. Abundante no ar, o N precisa se ligar ao hidrogênio para formar a amônia NH3. Os fertilizantes nitrogenados sintéticos tem o gás natural como matéria prima principal para a obtenção da amônia NH3, que é a mãe da Ureia, do Nitrato de Amônio e do Sulfato de Amônio, fertilizantes que dominam o mercado mundial.

A Ureia é o fertilizante nitrogenado mais usado no mundo, devido a inúmeras vantagens: alta concentração de N 46 %, baixo custo comparado com as outras fontes, excelente qualidade física quando granulada, compatível com a maioria dos outros fertilizantes, permitindo a fabricação de formulas altamente concentradas.

A sua grande limitação é que quando aplicada na superfície dos solos – o que é necessário em um grande número de culturas – e não incorporada por chuvas, irrigação ou equipamentos, as perdas de N por volatilização podem ser de até 80%. A única recomendação para o uso eficiente da Ureia é que ela deva ser incorporada no mínimo a cinco cm de profundidade, que às vezes é de difícil execução. Essa perda é devido ao N da Ureia estar na forma amídica NH2 e quando aplicada ao solo – em presença de umidade – entra em contato com a uréase, que é uma enzima produzida por microrganismos e está presente em todos os solos. A uréase é um catalizador que acelera a reação de hidrolise transformando o NH2 em NH3 que é um gás e pode volatilizar com facilidade podendo causar elevadas perdas de N.

Uma das tecnologias mais modernas e baratas é a dos inibidores de uréase, que retarda a ação da uréase permitindo que a Ureia seja incorporada por chuva, irrigação ou equipamentos.

A grande vantagem do inibidor, é que ele é aplicado em baixas quantidades, não alterando a concentração da Ureia e nem a sua solubilidade, ao contrário das tecnologias de liberação lenta ou gradual. Em relação às outras fontes, o Sulfato de Amônio tem custo muito mais elevado e tem baixa concentração de N. Outra fonte importante é o Nitrato de Amônio (NAM), que tem como desvantagem graves problemas de qualidade física, pouca resistência dos grânulos ao transporte e armazenagem – perda de granulometria – alta higroscopicidade. A parte nítrica do Nitrato pode lixiviar com facilidade se não for absorvida pelas raízes. Uma das maiores desvantagens do NAM é que ele pode ser usado como matéria prima para explosivos e por isso é controlado pelo exército. Os inibidores de uréase são estudados há muitos anos, mas o único comercialmente disponível e com custos competitivos é o NBPT que não é produzido no Brasil, mas pode ser importado livremente.

O NBPT é um pó que deve ser solubilizado por um solvente que dará estabilidade ao produto final. O grande segredo industrial para produzir um inibidor de alta qualidade e estabilidade, é o solvente que cada empresa utiliza. O NBPT distribuído com exclusividade no Brasil pelo Grupo Fertipar é o produzido pela KOCH INDUSTRIES nos Estados Unidos. SUPER N é um grande sucesso nas culturas exigentes em N e cuja aplicação de Ureia não possa ser incorporada por motivos técnicos ou operacionais.

O termo usado no mercado, Ureia protegida, não é correto, pois coloca todo tipo de tecnologia nas mesmas condições, pois o SUPER N é uma Ureia tratada onde o NBPT penetra em todo o grão, ao contrário dos outros produtos que revestem os grânulos fisicamente. A Ureia SUPER N recebe um tratamento químico.

2. A produção brasileira de fertilizantes no Brasil está mais baixa em relação à2016 e as importações aumentaram. Qual é a sua opinião em relação à produção de fertilizantes no Brasil?

 ados sobre a produção nacional e importações brasileiras entre 2007 e 2017, no período de janeiro a outubro, mostram que a produção nacional caiu de 8,2 milhões para 6,9 milhões de toneladas, queda de 16%. No mesmo período as importações cresceram 50 %. Países não produzem fertilizantes porque tem vontade e sim porque possuem recursos naturais, que devem ser abundantes – para justificar altos investimentos com retorno a longo prazo –  logisticamente bem localizados e competitivos.

 Como nesse período as aquisições feitas notadamente por multinacionais não acrescentaram capacidade instalada, novos aumentos de produção vão depender de investimentos, que em função da grande oferta mundial não devem encorajar os investidores devido às condições de competitividade.

O nitrogênio é dependente de gás natural,  temos baixa disponibilidade do produto e alto custo de produção. A esperança é o Pré-Sal.

No potássio temos operação somente nas jazidas da Vale em Sergipe e a perspectiva de exploração de uma grande reserva na Amazônia com todos os problemas de custo de produção e logística de distribuição, além de problemas ambientais.

No fósforo temos jazidas em várias regiões, mas não temos S (enxofre) que é insubstituível na solubilização.  Se não tivermos Enxofre, mesmo que o fósforo seja competitivo a nossa dependência seria de 50%.

Novamente o Pré-Sal seria uma possível fonte de enxofre com aumento do refino de petróleo no país. Porém, há grande capacidade instalada no mundo a custos menores e fornecedores diversificados em vários países.

A indústria nacional quer proteção para produzir, esse tempo já passou, se nossa indústria não é competitiva, vamos importar. Não podemos escolher setores para receber privilégios. Se tivermos que subsidiar alguma coisa, seria em infraestrutura – portos, transportes, ferrovias, hidrovias, que beneficiariam vários setores e a economia como um todo. Se for para aumentar impostos para onerar as importações, sem dúvida estaremos mais uma vez na contra mão da modernidade.

3. O mercado de fertilizantes líquidos no Brasil está aumentando e em outros países os líquidos tem uma importante participação na fertilização. Qual a sua visão sobre a utilização de fertilizantes líquidos no mercado brasileiro?

Vamos excluir da nossa análise o uso em fertirrigação e gotejamento, que faz o líquido ser viável dependendo do custo e da maior eficiência em função da tecnologia. Nas outras formas de aplicação, não são produtos diferenciados e sim commodities na forma líquida.

As vantagens são mais teóricas do que práticas.  Será que as épocas de adubação vão coincidir com a época de aplicação de inseticidas, herbicidas, etc. Além disso, a inclusão de micronutrientes na forma de  sais solúveis não é a  mais indicada, pois os produtos podem lixiviar com facilidade. Como por exemplo, a utilização de ácido bórico como fonte de Boro que lixivia muito e rápido.

Há desvantagens também em relação à baixa produção nacional de Amônia, Nitrato de Amônio, Sulfato de Amônio e Ureia, ao uso de fórmulas de baixa concentração que oneram o transporte, que deve ser especializado e é oferecido por poucas empresas. . O custo não compensa.

Já tivemos uma indústria de líquidos que não cresceu como esperado. Várias usinas possuíam fábricas (misturadoras de matérias primas liquidas e sólidas) e grande parte foi desativada.

Em minha opinião, no curto prazo será um mercado de nichos. Para sair dos sólidos para os líquidos o preço da amônia e ácido fosfórico devem compensar a menor produção de sólidos ou deve haver matéria prima em excesso no mercado

Em 2008 o IPNI promoveu o II Simpósio Brasileiro de Fertilizantes Líquidos e Foliares, com palestrantes de vários países. Praticamente não acrescentaram nada em relação ao de 1994. As matérias primas continuam as mesmas – commodities – as dificuldades de suprimento, logística, concentração das fórmulas, permanecem.

Para agricultura de sequeiro, no momento não vejo o mercado de líquidos como promissor. Para áreas de fertirrigação via pivô central ou gotejamento o crescimento pode ser importante. Os foliares sem dúvida vão crescer muito. As conclusões dos especialistas não diferem muito entre 1994 e 2008.

4. Quais são os desafios do mercado de fertilizantes que você enxerga para o final e 2017 e para 2018?

Não esperamos grandes variações para 2018, se ocorrerem serão negativas, por exemplo, o menor uso de fertilizantes na safrinha em função de um atraso no plantio com possibilidade de menor produtividade. Já se conversa sobre uso de sementes de menor custo. Caso o preço do milho reaja, esse quadro pode mudar, vários produtores estão falando em sorgo, com pouco ou sem adubo.

As grandes culturas deverão ter desempenho parecido com 2017, caso o milho não apresente preços atraentes a área de soja pode crescer, pouco. A agricultura brasileira está muito estabilizada, não reagindo nem com muita euforia nem com muito pessimismo.

A área cultivada é grande e bem distribuída geograficamente, e mesmo diante de alguns percalços climáticos localizados há pouca variação na produção total. Ainda sobre o milho existe uma preocupação com a CIGARRINHA, praga que ocorreu na safrinha passada e assustou.

O mercado de 2017 deve crescer entre 1 a 2 % e 2018 não será muito diferente. Os preços internacionais das matérias primas subiram nesse final de ano e se mantidos poderão ser fonte de preocupação. Alguma turbulência política em função das eleições pode influir no câmbio e nos custos. Alguns especialistas de consultorias preveem baixo crescimento do mercado de fertilizantes para os próximos anos.

Sobre a Fertipar

O Grupo Fertipar iniciou sua trajetória em 1980 oferecendo fertilizantes para todas as culturas e os melhores serviços para o produtor rural. Presente nas principais regiões agrícolas do país, o Grupo Fertipar é atualmente composto por 12 empresas.

 

Equipe GlobalFert, 06/12/2017

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